domingo, 5 de janeiro de 2014

Oferendas ao nada

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Ao reler o livro A alma imoral, do rabino Nilton Bonder, encasquetei com uma expressão que, na primeira leitura, feita anos antes, não havia me despertado a atenção – e isso explica a razão de releituras serem necessárias, pois acontecem num outro momento da vida, em que o que não era relevante passa a ser. E nem preciso dizer que essa predisposição à releitura deveria existir para tudo, não só para livros.

Mas retornando ao ponto.

No livro, o rabino diz que muitos dos nossos sacrifícios e esforços são oferendas ao nada. Oferendas ao nada. Foi esta a expressão que me fez refletir sobre a quantidade de privações e abstinências a que nos submetemos e que têm serventia nula. Zero.

... A timidez, por exemplo. O que a timidez tem feito por você? Ela impede que você se relacione olho no olho, que arrisque uma conversa com um desconhecido, que apresente aos outros seu trabalho, suas propostas, suas ideias. Orgulhar-se da sua timidez, colocando-a num altar, é fazer uma oferenda ao nada.

O que a culpa tem feito por você? Tem impedido você de se responsabilizar pelos seus atos e renegociar com a vida, tem trancafiado você em casa, obrigando-o a lidar incessantemente com questões passadas, tem envelhecido você, consumido você, paralisado você, e você ainda se ajoelha e reza para cultuá-la. Outra oferenda ao nada.

O que a insegurança tem feito por você? Nada. O que o medo tem feito por você? Nada.

O narcisismo, menos ainda. Cultuando esse deus chamado “Eu”, você não olha para fora, não exercita a solidariedade, não considera o sentimento dos outros, não compreende, não perdoa, não evolui. Oferece a si próprio uma homenagem patética, fica preso a uma energia que não circula, não realiza troca alguma. Joga flores para a solidão.

Que em 2014 consigamos romper com nossos receios sobre o que os outros irão pensar de nós, com o que não nos traz retorno, com o que não nos insere no universo de uma forma mais efetiva e bonita. Chega de cultuar impedimentos. Façamos, para variar, oferendas ao risco.

Coração vermelhoMARTHA MEDEIROSCoração vermelho

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