segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Sobre ser mãe…

"Semana passada me telefonaram de um jornal para pedir um depoimento sobre mulheres que decidiram não ter filhos. Queriam um testemunho curto e rápido.

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Sobre um tema tão intenso? Fui curta e rápida, mas agora vou me estender.Tenho duas filhas planejadas e amadas, que nunca me provocaram um segundo sequer de arrependimento. Mas nunca fui obcecada pela maternidade. Acredito que qualquer mulher pode ser feliz sem ser mãe. Existem diversas outras vias para distribuirmos nosso afeto, diversos outros interesses que preenchem uma vida: amigos, trabalho, paixões, viagens, literatura, música - até solidão, se me permitem a heresia. Conheço mulheres que se sentem íntegras e felizes sem ter tido filhos, e mulheres rabugentas que tiveram não sei por quê, já que só reclamam. Há de tudo nesta vida.

Mas tenho pensado nesta questão porque, dia desses, uma amiga inteligente, realizada e linda completou 50 anos e se revelou meio abatida por certos questionamentos que chegaram com a idade - uma idade que está longe de ser das trevas, mas que é emblemática, não se pode negar. Ela nunca quis ter filhos. Escolha não, impossibilidade. Tem uma vida de sonho, mas ela anda se perguntando: não tive filhos, será que fiz bem? Ninguém tem a resposta. Mas é fácil compreender o dilema.

Quando entramos nos 30, o relógio biológico exige uma decisão: ter ou não? Algumas resolvem: não. Criança dá trabalho, criança demanda muita atenção, criança é dependente, criança interfere no relacionamento do casal, criança dá despesa, criança é pra sempre. Tudo verdade, a não ser por um detalhe: crianças crescem. Crianças se transformam em adultos companheiros, crianças são quase sempre nossa versão melhorada, crianças herdarão não apenas nossos anéis, mas nossos genes, nosso jeito, nossa história, e isso é explosivo, intenso, diabólico, fenomenal. Aos 30, só pensamos na perda da liberdade, mas, aos 50, conseguimos finalmente entender que a maternidade é muito mais do que abnegação, é uma aposta no futuro. Depois dos anos palpitantes e frenéticos da juventude, chega uma hora em que deixamos de pensar apenas no lado prático da vida para valorizar as conquistas emocionais, que são as que verdadeiramente nos identificam. Não estou fazendo apologia da maternidade, sigo acreditando que todas as escolhas são legítimas. Mas optar por não ter filhos não é algo trivial. É uma experiência profunda de que abriremos mão de vivenciar. É uma emoção que transferiremos para sobrinhos sem jamais saber como seria se eles fossem gerados por nós - ou adotados, o que dá no mesmo. Vale a pena desprezar este investimento de amor? Um investimento que, diga-se, é uma pedreira muitas vezes, não é nenhum mar de rosas! Nessas horas é que faz falta uma bola de cristal. O problema é se a dúvida vier nos atazanar mais adiante. A gente nunca sabe como teria sido se... É por isso que, neste caso, compensa queimar bastante os neurônios antes de decidir. Não dá para pensar no assunto levando-se em conta apenas o momento que se está passando, mas o contexto geral de uma vida. Porque não ser mãe também é para sempre."

Martha Medeiros

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