As águas de março eram o fim do caminho e, da viagem seguinte, você era o começo.
Novos amores se anunciavam como flores, a começar pelo seu. Novos ares. Alguns desejados, outros não, revelando que a vida é quem faz as escolhas, por mais que nos dê outra ilusão. Ela nos brinca e em suas mãos somos criança. Entre uma brincadeira e outra, vem a morte para nos ensinar tanto a urgência como a calma resignação.
E é no jogo bobo e repetido que vai se revelando: o que passa, o que vem para ficar, o que é só caminho, o que é lugar para morar.
O tempo avança e luto para conquistar finalmente a calma. Penso que a conheço, mas ela me foge invisível. Em minha pressa de fazer sozinha, como se eternamente eu não vá ter com quem contar, me vejo a cada dia mais veloz, elétrica, acelerada. O que ontem sequer existia me invade e amanhece urgente, imprescindível, essencial.
Em minha ânsia de viver, esqueço de respirar. E o que é pior: sufoco também.
Você é tão parecido comigo, filho. A paciência que lhe peço é a paciência que não tenho. Por tantas vezes a vida me parece gritar pedindo que eu espere. Que eu espere, porque já vem. Mas não consigo.
Escrever é meu respiro, é quando tomo o ar para novos vôos – por mais rápido que voe, o avião parece flutuar entre as nuvens, essa ilusão de tempo e de espaço que nos dá a dica: a vida é tal e qual.
A vida é provocação. Se um dia me grita que é curta, manda em seguida a mensagem de que é preciso saber esperar. Avança e recua, oferece e retira, para nos medir, não a força, mas a capacidade de brincar.
E como você ao repetir mil vezes um mecanismo novo que acaba de descobrir, o tempo oferece meditação. É assim o seu jogo, com enigmas que mais rápido nos devoram se os tentamos engolir.
Não importa o quão irritante isso tudo me pareça. Nada vai mudar o fato de que não se toca o tempo com a mão. Não posso empurrá-lo ou puxá-lo, ele não vai nem vem, não pode que lhe sejam.
Admito, tenho pressa. Mas é pressa de chegar em casa e finalmente descansar. Pressa de ter calma. Pressa e sempre inimiga. É que nessa correria feia, por mais vezes me perco no caminho, sem conseguir chegar.
Em minha tentativa de lhe apresentar a serenidade, descubro que você é que veio me ensinar. O tempo, em seu ritmo criança, nos faz todo dia o mesmo convite a viver delicadas repetições e, assim, sorver a essência sutil do que não é feito.
Espero que eu, sempre tão rápida, não aprenda tarde demais."
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